Governantes eleitos precisam traçar planejamento e se comprometer com o setor de energia
Independentemente dos vencedores das eleições em outubro, que decidirão quem serão os governantes do Brasil e do Rio Grande do Sul nos próximos anos, para os empreendedores do segmento de energia uma questão será fundamental: o estabelecimento de metas e de políticas claras para essa área. Particularmente no Estado, há temas fundamentais que precisam ser acompanhados pelos gestores públicos como a busca pela autossuficiência energética dos gaúchos, o desenvolvimento de projetos eólicos offshore (sobre as águas) e o aprofundamento dos estudos sobre o uso do hidrogênio verde.
O presidente do Sindicato da Indústria de Energias Renováveis do Rio Grande do Sul (Sindienergia-RS), Guilherme Sari, argumenta que o Estado está começando a se posicionar de forma diferente no setor de energia. Ele defende que é preciso aproveitar o potencial gaúcho quanto às energias renováveis e elaborar um plano para o desenvolvimento nesse campo. Para o representante do Sindienergia-RS, o Estado estruturou-se para a possibilidade de atingir a sua autossuficiência energética. “É essa a nossa busca hoje, o Rio Grande do Sul parar de ser um importador de energia”, afirma.
Ser autossuficiente permitiria ao Estado aprimorar seu parque industrial e aumentar sua competitividade. Sari aponta que outra vantagem é o fato de mais de 80% da matriz elétrica gaúcha ser constituída por fontes renováveis, seja hídrica, bioenergias, eólica ou solar. Ele recorda que vários candidatos têm se posicionado com discursos a favor do crescimento desse tipo de geração e a expectativa é que essa intenção seja cumprida por quem assumir a futura gestão do governo gaúcho.
Um dos tópicos que o governo estadual poderá incentivar o desenvolvimento são os parques eólicos offshore no mar. Contudo, segundo o presidente do Sindienergia-RS, o Estado terá um papel ainda mais protagonista quanto aos empreendimentos que poderão ser implementados nas lagoas locais. “Hoje, há muitos investidores vendo essa situação com bons olhos”, adianta.
Para Sari, o Rio Grande do Sul tem condições de exercer o pioneirismo no Brasil quanto ao aproveitamento de lagoas para a produção de energia eólica. O presidente do Sindienergia-RS frisa que o Estado tem ferramentas para deixar o ambiente mais propício à atração de investimentos, seja através de ações no campo tributário, desburocratização de licenciamentos e participação em temas relevantes para o setor. O dirigente salienta que o apoio do poder público a uma determinada iniciativa ou segmento é um facilitador para que ações sigam adiante e saiam do papel.
Sari diz ainda que a parceria entre entidades privadas, que representam uma classe empreendedora, como é o caso do Sindienergia-RS, com a esfera pública é fundamental para a troca de informações e definição das demandas e gargalos de uma atividade. “Mas, o que sentimos um pouco de falta é que o Rio Grande do Sul precisa aparecer mais, ter mais destaque nacionalmente”, comenta. Ele enfatiza que o Estado possui mão de obra qualificada, é industrializado, entretanto ainda falta mostrar de uma maneira mais intensa as oportunidades e iniciativas que se apresentam localmente. O dirigente reitera que é essencial que representantes do governo gaúcho participem das discussões nacionais sobre o futuro do setor de energia no País.
Já em âmbito nacional, Sari admite que a polarização política é algo que gera certa apreensão. O presidente do Sindienergia-RS sustenta que é preciso ter clareza quanto ao planejamento que será adotado para o segmento energético, onde os empreendedores possam investir com uma segurança jurídica satisfatória. “É isso que a gente espera do governo federal, que ele seja menos político e mais negociador, que consiga acolher todos os entendimentos e possibilidades de investimentos que o mundo global pode oferecer”, indica Sari.
“Importação” de energia gera receita longe do Estado
O coordenador do comitê de geração distribuída do Sindienergia-RS, Frederico Boschin, concorda que uma pauta importante dentro do setor de energia, para a pessoa que assumir como governador gaúcho, será a busca pela independência energética do Estado. Ele recorda que o Rio Grande do Sul “importa” hoje de outras regiões do País em torno de um terço do seu consumo. Essa situação, reforça Boschin, implica a geração de ICMS em outros estados.
Para ele, é uma questão lógica aproveitar a disponibilidade local de fontes renováveis. “O Rio Grande do Sul deveria ter um projeto de Estado de fomento a essas energias, que fosse além do desenvolvimento dos atlas temáticos (que mapeiam o potencial de produção de energia em solo gaúcho) que foram criados”, defende.
Outro ponto que precisa ser abordado, conforme Boschin, é buscar trazer para o Estado as novas tecnologias que estão sendo desenvolvidas no planeta na área energética. Nesse sentido, ele argumenta que uma unidade de regaseificação seria importante para ter mais geração termelétrica local, assim como a possibilidade de uma outra fonte de suprimento de gás natural (hoje limitada ao insumo que vem da Bolívia). O coordenador do comitê de geração distribuída do Sindienergia-RS sustenta que é preciso envolver o Rio Grande do Sul no novo mercado de gás, aumentando a oferta desse combustível, o que poderá contribuir para atrair novos empreendimentos como plantas de fertilizante e melhorar a competitividade industrial.
Boschin avalia que é possível trabalhar em políticas de incentivo tributário para criar um ecossistema saudável dentro do segmento de energia, o que também está atrelado a um processo de desburocratização e melhoria da comunicação dentro da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), assim como a modernização dos procedimentos de licenciamentos. Para o integrante do Sindienergia-RS, o Estado também pode aproveitar o forte cooperativismo na região, que possui diversas entidades dessa natureza atuando na área de energia, para incrementar a infraestrutura no meio rural.
No cenário federal, Boschin diz que a primeira ação que precisa ser tomada é o estabelecimento de uma governança dentro do setor elétrico. Ele afirma que é necessário ter uma orientação nacional para, entre outros pontos, baratear o custo da energia elétrica não somente com cortes pontuais de impostos. “A gente precisa ter um aumento da oferta de energia no Brasil, mas isso passa por uma governança do País apontando quais as fontes que serão priorizadas, onde serão localizadas e como serão os incentivos setoriais adequados”, relata.
Quanto aos combustíveis, Boschin afirma que é preciso trabalhar com o incremento da oferta de gasolina e diesel no País para não depender tanto da balança internacional. E já com a energia elétrica é necessário regrar de maneira mais clara o autoconsumo e a autoprodução no caso da geração distribuída.
Rio Grande do Sul está inserido na busca da sustentabilidade energética
De 2015 até agora, conforme recorda o coordenador do Comitê Jurídico Regulatório (COJUR) do Sindienergia-RS, Alexandre Curvelo, o Brasil passou a aderir a compromissos internacionais relacionados à geração de energia renováveis. E o Rio Grande do Sul, assinala ele, também tem se envolvido com a essa pauta “verde”.
“Eu espero que os novos governantes, tanto em âmbito nacional como estadual, tratem as energias renováveis como matéria de Estado, um tema relacionado ao desenvolvimento do País, que seja uma bandeira estável e levada à frente qualquer que seja a agremiação partidária do candidato vencedor”, salienta Curvelo. Ele reforça que tanto o Brasil como o Rio Grande do Sul têm ingressado em temas novos dentro da área de energia, como a questão da geração eólica offshore e a produção de hidrogênio verde. Quanto a esse último assunto, Curvelo diz que a expectativa é que o Estado dê continuidade às ações que possibilitem explorar o potencial apresentado por esse recurso.
No caso da produção eólica offshore, o coordenador do COJUR considera que o governo estadual já deu indícios quanto ao apoio ao desenvolvimento de projetos nesse segmento, mas ainda de uma forma um pouco tímida. Ele diz que é preciso observar toda a oportunidade que os gaúchos possuem para essa atividade e começar a trabalhar para dar condições que permitam ao mercado perceber o Rio Grande do Sul como um ambiente convidativo para seus investimentos.
“Um Estado que ofereça não somente amparo jurídico, mas caminhos que reduzam a burocracia e os entraves para que esses projetos possam ser realizados”, aponta Curvelo. De acordo com ele, o Rio Grande do Sul ainda tem um “tema de casa” a ser feito nesse campo dos parques eólicos offshore para atuar como um agente ativo e não apenas esperar que os investidores venham.
Curvelo acrescenta que, sobre esse tema, os empreendedores esperam a aprovação de uma lei federal para regular o assunto. Já no caso do Rio Grande do Sul ainda há a possibilidade do aproveitamento da geração eólica em lagoas, que não está relacionada exclusivamente à legislação da União e pode ser tratada pelo Estado de forma suplementar. O coordenador do COJUR do Sindienergia-RS ressalta que, no Brasil, a energia elétrica é um serviço público que depende de concessões e autorizações do Estado. “Não é uma atividade de mercado que sofre regulação, é uma prática pública que passa por um processo para se transformar em uma atividade privada”, frisa.
Dentro desse contexto, Curvelo enfatiza que, se tratando de energia elétrica, é impossível não cogitar a presença do Estado e da regulação. “O que precisa mesmo é amadurecer as instituições e fortalecer a segurança para o investidor”, sustenta o dirigente. Conforme Curvelo, a concepção de um Estado burocrático está sendo mudada para uma figura menos atuante e mais fiscalizadora das ações do mercado.
Produção de hidrogênio verde se apresenta como oportunidade para os gaúchos
Estabelecer uma política de fomento a projetos de hidrogênio verde, de modo que o Estado se posicione como um hub importante nesse campo, com foco em produção de amônia para fertilizante, exportação e uso para transporte e indústria, é um pleito defendido pelo coordenador do comitê técnico do Sindienergia-RS, Pedro Mallmann. Além disso, ele também sugere que sejam aproveitadas as linhas de transmissão construídas para a implementação de novos projetos de energia do Rio Grande do Sul, reduzindo a necessidade de importação de energia.
Mallmann considera que o próximo governador deve continuar o trabalho de gestão ativa sobre os projetos de energia mais maduros, para assegurar que eles tenham a competitividade necessária para entrarem em operação. “E avançar com a regulamentação de novas alternativas de geração, como near shore em lagoas, abrindo o potencial de novas fronteiras de geração competitiva de energia”, complementa.
Segundo o coordenador do comitê técnico do Sindienergia-RS, os projetos gaúchos de geração de energia precisam ser competitivos nacionalmente. Ele sustenta ainda que o governo gaúcho tem que trabalhar para a realização de novos leilões de transmissão, de modo a evitar que o Estado passe por uma situação parecida à vivida com a não implantação de linhas e subestações leiloadas em 2014. “Quando ficamos sem a possibilidade de implementar novos projetos (de geração), por falta de conexão”, lembra.
Já quanto ao presidente da República, Mallmann diz que o País precisa pensar o seu futuro energético para cumprir com os seus compromissos ambientais e também para aproveitar a sua matriz limpa no comércio internacional e para não perder essa posição de liderança, que é pouco explorada. “Muitas regras do nosso setor são antigas e ultrapassadas, por isso tem-se falado muito na modernização do setor”, acrescenta.
Exemplos disso, citados pelo coordenador do comitê técnico do Sindienergia-RS, são a redução dos limites para acesso ao Mercado Livre de energia e a intensificação do sinal locacional nos custos de transmissão. “Sinal locacional significa que o preço de transmissão terá uma parcela de rateio menor entre todos os agentes e que a localização tanto da geração quanto do consumo passará a ter um impacto maior”, detalha.
Mallmann adianta ainda que o mercado de carbono será uma realidade. Essa regulamentação, frisa o dirigente, precisa ser feita com muita atenção, para que atinja os objetivos pretendidos e se caracterize por um incentivo à redução da pegada de carbono da cadeia industrial. Para ele, a modernização e o mercado de carbono podem levar a uma das metas do setor elétrico, que é a modicidade tarifária, diminuindo o custo de vida da população e aumentando a competitividade da indústria.
Texto: Sindienergia-RS